terça-feira, 9 de dezembro de 2014

O dia de meu nome

O dia de meu nome é o mesmo dia que nasci.
Neste dia, as dez e quarenta, do ultimo ano de 70;
Eu chorei; pois no dia de meu nome não sorri.

O dia de meu nome é em dezembro.
Entretanto, hoje recordações de um passado,
De amigos dos retratos, da uma vida de um pardo...
Memórias se esvaem nas ampulhetas do tempo.

Do que foi, guardo o que lembro.
Do que sou, vivo no desejo do vento.
E, o que serei ?

Isso sim;
deixo ao acaso...

... de meu contentamento.

Igor Moreira

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

A garota que eu amo

A garota que eu amo
é como um sonho em dia de verão,
capaz de fazer resplandecer o Sol em céu de tempestade com um simples olhar seu.

A garota que eu amo
fala tudo ao contrário, vive rindo à toa
e gosta de ouvir mil vezes a mesma coisa

A garota que eu amo
é sincera, humilde e companheira
e às vezes se chateia se eu não fico com ela até não mais poder

A garota que eu amo
tem um jeito todo especial de encantar,
maravilhar e de ser

A garota que eu amo não me ama
mas eu à amarei sempre
Eternamente...


Augusto Branco

domingo, 30 de novembro de 2014

quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Os teus pés

Quando não posso contemplar teu rosto,
contemplo os teus pés.
Teus pés de osso arqueado,
teus pequenos pés duros.

Eu sei que te sustentam
e que teu doce peso
sobre eles se ergue.

Tua cintura e teus seios,
a duplicada purpura
dos teus mamilos,
a caixa dos teus olhos
que há pouo levantaram voo,
a larga boca de fruta,
tua rubra cabeleira,
pequena torre minha.

Mas se amo os teus pés
é só porque andaram
sobre a terra e sobre
o vento e sobre a água,

até me encontrarem.

Pablo Neruda

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

domingo, 2 de novembro de 2014

o pássaro azul

Tradução: Pedro Gonzaga

há um pássaro azul em meu peito
que quer sair
mas sou duro demais com ele,
eu digo, fique aí, não deixarei que ninguém o veja.
há um pássaro azul em meu peito que
quer sair
mas eu despejo uísque sobre ele e inalo
fumaça de cigarro
e as putas e os atendentes dos bares
e das mercearias
nunca saberão que
ele está
lá dentro.
há um pássaro azul em meu peito
que quer sair
mas sou duro demais com ele,
eu digo,
fique aí,
quer acabar comigo?
(…) há um pássaro azul em meu peito que
quer sair
mas sou bastante esperto, deixo que ele saia
somente em algumas noites
quando todos estão dormindo.
eu digo: sei que você está aí,
então não fique triste.
depois, o coloco de volta em seu lugar,
mas ele ainda canta um pouquinho
lá dentro, não deixo que morra
completamente
e nós dormimos juntos
assim
como nosso pacto secreto
e isto é bom o suficiente para
fazer um homem
chorar,
mas eu não choro,
e você ?


Charles Bukowski




terça-feira, 1 de abril de 2014

Meu primeiro de abril de 64


Eu estava no show que inaugurava o teatro da UNE e testemunhei o incêndio no dia que mudou o Brasil.

Onde vocês estavam no dia primeiro de abril de 1964?
Pois bem, eu estava na UNE.

São 11 e meia da noite do dia 31 de março de 1964 e eu assisto a um show que inaugura o teatro da UNE, com Grande Otelo, Nora Ney e Elza Soares. Acho estranho que festejem uma vitória sem a tomada do poder. Mas um companheiro me abraça eufórico: “Já derrotamos o imperialismo; agora só falta a burguesia nacional!”

Não vejo o Tio Sam de joelhos ali, mas fico animado: “Viva!” Estou felicíssimo: tenho 20 anos, o socialismo virá, sem sangue, sem balas e com a ajuda do governo do Jango. Sentíamo-nos o “sal da terra”.

Eu pensava: “Conscientizarei as massas pobres do país para um futuro justo e feliz”. Cheio de fé, vou para casa, mas voltarei cedo à UNE onde haverá uma reunião politica às nove da manhã.

Estou de novo dentro da sede, ouvindo as diretrizes do dirigente de nossa “base” do PCB, um comuna velho de nariz de couve-flor, e penso: “Como ele pode fazer revolução com esse nariz?” Ele nos garante que o Exército está do lado do povo, porque tem “origem de classe média”. Sinto-me protegido pelos bravos soldados do povo, quando começo a ouvir gritos e tiros lá fora. Corremos todos para a sacada e vemos dezenas de estudantes que apedrejam a fachada, atirando para o alto. “São os estudantes de direita da PUC. Temos de reagir!” — diz alguém. “Com quê?” — pergunto. Onde estão as armas revolucionárias? Nada. Ninguém tem uma reles Beretta. O dirigente da “base” fica com o nariz muito branco, que antes era pink. Nuvens de fumaça entram pelas salas. A UNE está pegando fogo. Estudantes armados invadem a sede com garrafas de gasolina. O teatro queima. Fujo por uma janela dos fundos, onde rasgo a calça num prego. Apavorado, corro para a porta da UNE, ostentando naturalidade, para ver o que está acontecendo. Reconheço vários colegas ricos de minha faculdade, com revólveres na cinta, numa selvagem alegria destrutiva. Dois colegas da PUC me veem. Eles vêm com armas na mão, afogueados pela guerra santa. “E aí, cara!? Grande vitória, hein?! Acabamos com esses comunas sem-vergonha!” — me gritam, arquejando de contentamento. Se tivesse a automática 45mm de meu pai milico, entraria num duelo de western com eles. Eles me olham. Estou pálido, mas tenho a dignidade de não dizer nada. Viro as costas e saio andando pelo asfalto, esperando o tiro me derrubar. Procuro com os olhos os bravos soldados do “Exército democrático”. Surge um comboio de tanques. Passa por mim um companheiro que sussurra: “Some, porque o Exército virou a casaca!”. Vejo os tanques, com os “recrutas do povo” montados em cima, e entendo que minha vida adulta está começando, mas de cabeça para baixo. Outros companheiros se dispersam à distância, enquanto a UNE arde. “Ali estão queimando os nossos sonhos” — penso — “ali queima a ‘libertação do proletariado’, ali morre em fumaça minha juventude gloriosa, queima um Brasil que me parecia fácil de mudar, um Brasil feito de esperanças românticas”.

Lembro-me do comício da Central, 15 dias antes, quando senti um arrepio vendo o Jango falar em “reformas populares” sem convicção, entre as tochas dos petroleiros e perto da mulher Tereza, vestida de azul, ausente e linda. Lembro-me também das velas acesas nas janelas da cidade pela classe média, de luto contra Jango, e lembro-me que pensei: “Isso vai dar bode!”.

Agora, a UNE pega fogo como uma grande vela. Vou andando para longe dali, para o Centro, e as árvores do Russel me ameaçam com seus galhos, vejo a estátua de São Sebastião flechado e me sinto mártir como ele, passo pela Praça Paris, onde Assis Valente se matou com formicida, e penso em sua música: “Está na hora dessa gente bronzeada mostrar seu valor!..”

Chego ao Passeio Público cercado de carros de combate e vejo que o mundo mudou. Sento-me perto de um laguinho e fico vendo os rostos das pessoas, mendigos com latinhas e sacos de aniagem, uma mulher bêbeda dançando, vejo o Rio pela primeira vez, como se tivesse acordado de um sonho para um pesadelo. As pessoas se movem em câmera lenta, as buzinas estão altas demais no trânsito engarrafado, e eu me sinto exilado em minha própria terra. Na Cinelândia, grupos de soldados montam guarda. São recrutinhas fracos, com capacetes frouxos e cara de analfabetos; o povo monta guarda contra nós. Numa vitrine, televisões mostram o Castelo Branco entre generais. Este é o novo presidente? Parece um ET de boné. Vou andando, sem lenço e sem nada. Paro na porta de um cinema onde passa “Lawrence da Arábia”. Finjo que olho os cartazes. Alguém me bate no ombro; viro em pânico e vejo um velhinho vendedor de loteria, que me segreda: “Sua calça está rasgada atrás...” Apalpo o grande estrago do prego da UNE e saio mais tonto. “Meu Deus... eu que imaginava os grandes festivais do socialismo com Lênin e Fidel, eu que era um herói, virei um bunda-rasgada!” Percebo que um Brasil ridículo, que sempre esteve ali, está vindo à tona. Ninguém quer me prender. Sou invisível. Vejo um ônibus que vai para minha casa. Me jogo dentro. Passo em frente à UNE e não quero olhar, pois sei que vou ver o fogo, bombeiros apagando. Não resisto, e o casarão preto passa, entre brasas e fumaça. Chego em casa, trêmulo. Minha mãe está com duas tias na sala. Uma delas, carola de igreja, que marchou pela Família, Deus e Liberdade, me beija muito e diz: “Toma aqui essa medalhinha de Santa Terezinha do Menino Jesus pra te proteger!..” E pespega em minha blusa a santinha com uma fita vermelha. Meu desespero é indescritível. Minha mãe me abraça chorando: “Ele não é comunista, não!.. Ele é bom, bom! Está pálido, meu filho... Come esse bolinho de milho...”

Fico olhando os bibelôs da sala, mastigando o bolo. Vejo os elefantes de louça, o quadro do Preto Velho, os plásticos nas poltronas, o lustre de cristal, orgulho de mamãe. E, afinal, entendo que minhas tias estão no Poder e que eu não existo.

(*) Este artigo é reprodução de um texto que escrevi há quatro anos. Mas, diante da data de hoje, creio que vale a pena ler de novo.


Arnaldo Jabor


quarta-feira, 26 de março de 2014

Deixe o sol entrar

Deixe o sol entrar, pois já é um novo dia.
Como um mar em ruínas de tanto bradar,
Neste cântico pensamentos noturnos, vou contar.

O cortejo da mente das cousas tristes da vida,
Nestes novos dias de tanta alegria.
Meus sonhos absortos ainda a naufragar.


Igor Moreira

domingo, 23 de março de 2014

Quando criança

Ambição, a cada nova impressão.
É o primeiro passo de um homem,
Ou quiçá de uma nação.

Dizer lhe a verdade é perigoso,
lhe convencer è fatal.

Quando criança acreditava...
...no natal.

Viver é o acontecer único.
Existir é totalmente opcional.

Quando criança acreditava...
...no natal.

E ser pensante,
Inerentemente, é ser,
Incompreensível !


Igor Moreira 






quinta-feira, 20 de março de 2014

Noites de março

A vida é linda,
E tens impiedoso perseguidor;
A morte é certa!

Vem com as chuvas deste fevereiro,
Que corta no peito uma dor de raiz;
Toda aridez de março.

O que deverias ser dito
E nunca escrito;
Duvide!
Insisto a incomodar,
Aquilo que respeitamos.

Isso me consome,
Dia e noite todos sentimentos;
Em noites destas...

...minhas batalhas íntimas
Que sempre sou vencido
pelas minhas idéias.


Igor Moreira 






segunda-feira, 17 de março de 2014

Versos pedidos

Seja sempre o que és.
Melhores versos não pensaria,
Pra descreve lá, da cabeça aos pés.

Se de outrem flores recebeste um dia,
Agora poesia lhe dou, em pensamento,
Minha riqueza e melancolia.

Pois a beleza como em teu olhar,
Há muito, o meu não via.
Guarde no coração o que digo,

A ti neste momento, por toda vida!

Igor Moreira

sexta-feira, 14 de março de 2014

Literatura

O Érico é Veríssimo.
O Fernando é Pessoa,
Mas só o Jorge é amado.

Igor Moreira

Ariana

Mulher atraente e bela.
A ariana o sentimento zela,
Mas em disputa não é vencida.

És pra mim rara flor,
Quiçá, será meu denominador.
Proponho lhe a palavra amor...

Há muito por todos esquecida.

Igor  Moreira

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

ANNABEL LEE de Edgar Allan Poe

Foi há muitos e muitos anos já,
Num reino de ao pé do mar.
Como sabeis todos, vivia lá
Aquela que eu soube amar;
E vivia sem outro pensamento
Que amar-me e eu a adorar.

Eu era criança e ela era criança,
Neste reino ao pé do mar;
Mas o nosso amor era mais que amor --
O meu e o dela a amar;
Um amor que os anjos do céu vieram
a ambos nós invejar.

E foi esta a razão por que, há muitos anos,
Neste reino ao pé do mar,
Um vento saiu duma nuvem, gelando
A linda que eu soube amar;
E o seu parente fidalgo veio
De longe a me a tirar,
Para a fechar num sepulcro
Neste reino ao pé do mar.

E os anjos, menos felizes no céu,
Ainda a nos invejar...
Sim, foi essa a razão (como sabem todos,
Neste reino ao pé do mar)
Que o vento saiu da nuvem de noite
Gelando e matando a que eu soube amar.

Mas o nosso amor era mais que o amor
De muitos mais velhos a amar,
De muitos de mais meditar,
E nem os anjos do céu lá em cima,
Nem demônios debaixo do mar
Poderão separar a minha alma da alma
Da linda que eu soube amar.

Porque os luares tristonhos só me trazem sonhos
Da linda que eu soube amar;
E as estrelas nos ares só me lembram olhares
Da linda que eu soube amar;
E assim 'stou deitado toda a noite ao lado
Do meu anjo, meu anjo, meu sonho e meu fado,
No sepulcro ao pé do mar,
Ao pé do murmúrio do mar.


Fernando Pessoa

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

SONETO LXX

Se te censuram, não é teu defeito,
Porque a injúria os mais belos pretende;
Da graça o ornamento é vão, suspeito,
Corvo a sujar o céu que mais esplende.
Enquanto fores bom, a injúria prova
Que tens valor, que o tempo te venera,
Pois o Verme na flor gozo renova,
E em ti irrompe a mais pura primavera.
Da infância os maus tempos pular soubeste,
Vencendo o assalto ou do assalto distante;
Mas não penses achar vantagem neste
Fado, que a inveja alarga, é incessante.
Se a ti nada demanda de suspeita,
És reino a que o coração se sujeita.


William Shakespeare